Desde as primeiras iniciativas, quando o ser humano tentou explicar o mundo em que vivia a partir de suas próprias capacidades de análise e percepção, a natureza sempre se apresentou como ponto de partida de toda e qualquer reflexão. Assim, em maior ou menor grau, o “ser curioso” próprio da condição humana é movido pelo interesse permanente de investigar o mundo que o cerca, seja por dilantelismo ou por necessidade.
Foram os gregos os pioneiros na tentativa de superar explicações míticas sobre a origem do cosmos, bem como para protestar contra o determinismo atribuído à condição humana diante da “incontestável vontade” dos deuses.
O debate sobre a percepção de que a realidade, como um todo, pode ser explicada em seus próprios termos, está presente entre os primeiros pensadores que olharam curiosamente para elementos específicos da natureza e perguntaram sobre o princípio unitário (arché) que é a base e pressuposto de onde provém tudo o que existe. Nessa linha tem-se “fisiocratas” ou filósofos da natureza como Tales (623-545) que afirmara ser a água substância única e que permanece a mesma em todas as transformações dos corpos.
Porém, o ser humano, aos poucos, ao se deparar diante da natureza para suprir suas necessidades, percebe-se dotado de uma capacidade singular que lhe permite ir além de sua condição estática no que se refere à acomodação ao mundo. E nesta relação curiosa se estabelece entre ser humano e natureza uma tensão que aos poucos os separa, os distancia, definindo e demarcando uma oposição consciente do homem curioso que é despertado pelos limites de um mundo que o desafia e aos poucos vai deixando de ser mero local de adaptação para tornar-se contexto de um contínuo processo de superação e transformação, que se constitui num circular exercício de aperfeiçoamento de sua capacidade criativa e criadora.
Segundo Freire (2005), é a curiosidade que motiva e propicia as bases para a constituição do conhecimento havendo, portanto, relação entre “senso comum” e “cultura científica”: A curiosidade do índio é igualzinha à curiosidade de Einstein. A diferença é que antes Einstein rigorizou os caminhos de aproximação da objetividade, isso quer dizer, ele tinha os meios científicos, a metodização rigorosa que resulta em achados mais ou menos exatos, mas a curiosidade que motiva, que produz e empurra o conhecimento é a mesma do índio, a minha e a tua (FREIRE, 2005).
No entanto, Freire chama a atenção para o fato de que o plano teórico exige uma superação da curiosidade ingênua na direção daquilo que ele denomina de “curiosidade epistemológica” ou seja, que deixe sua espontaneidade própria do senso comum e opere com certo grau de rigor metódico.
É a crítica, segundo Freire, que possibilita a superação do pensamento ingênuo pelo pensamento epistemológico e somente ela é capaz de “depurar” possíveis condicionamentos históricos que podem neutralizar o desenvolvimento da curiosidade humana tendo em vista sua mera adaptação sócio econômica. Sem a crítica à busca das “razões de ser” daquilo que se aprende, o pensamento se converte em mera erudição, acúmulo de informações rigorosamente adquiridas, porém, descompromissadas com a realidade concreta.
PEROZA, Juliano e Resende, m. a. A dialética da curiosidade: Pressupostos para uma praxiologia do conhecimento em Paulo Freire. X Congresso Nacional de Educação. Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, novembro de 2011.